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Análise Global de
Problemas da Guanabara
Uma vez expostas, ainda que em um
simples resumo, as obras que realizamos, julgamos oportuna a análise
global dos grandes objetivos que o Governo Chagas Freitas alcançou
por meio do trabalho executado pela Secretaria de Obras Públicas.
Este plano de obras que
desenvolvemos na Secretaria de Obras Públicas foi da ordem
de 1 bilhão e meio de cruzeiros.
Para que ele se realizasse,
contamos sempre com o apoio decidido do Governador Chagas Freitas
e com o perfeito entrosamento entre órgãos e
eficientes auxiliares. Sem o espírito de servir à
causa pública dos homens que compõem esta imensa máquina
administrativa, não nos seria possível levar a bom
termo tal plano, que representa o maior investimento em obras já
feito no Rio de Janeiro por uma só administração,
em toda a sua história.
No setor viário,
investimentos superiores a 700 milhões de cruzeiros
permitiram a execução da política de implantação
de vias expressas, cujo sentido econômico e social cremos não
ser necessário mais enfatizar.
No campo do abastecimento de água,
investimos 300 milhões de cruzeiros para dar ao Rio de
Janeiro, pela primeira vez em sua história, condições
de perfeito equilíbrio entre a oferta e o consumo, que
constituem uma verdadeira redenção para certas zonas
tão sofridas neste setor, como a Zona da Leopoldina, por
exemplo.
No campo do esgotamento sanitário,
investimos 250 milhões de cruzeiros, para sanear
definitivamente as praias da Zona Sul com a obra do emissário
de Ipanema e minorar o angustiante problema da condução
e do destino final adequado dos esgotos da Zona Norte. Construindo
e reformando escolas, hospitais, praças, algumas em pleno
centro da cidade, a Secretaria de Obras Públicas investiu 1
bilhão e meio de cruzeiros em seu plano de obras, para o
benefício social, econômico e do lazer da população
carioca.
Julgamos de nosso dever, já
que falamos tanto do presente, alinhar alguns pontos sobre o
passado e o futuro de nossa cidade.
O diagnóstico de nossos
problemas urbanos nasceu a partir da compreensão da evolução
histórica do Rio de Janeiro. A ocupação de
seu território, que se iniciara nas colinas do Castelo de São
Bento, de Santo Antonio e da Conceição, marcando a
sua primeira configuração urbana, ganhou seqüência
com a conquista civilizada dos vales e a escalada de pequenas
encostas, vencendo a poder dos meios de penetração
então disponíveis, os limites das barreiras que a
natureza caprichosamente interpôs à ânsia de fácil
e desmedida expansão.
A topografia ajudava a cidade a se
constituir, neste início de vida urbana, numa estrutura una
e solidamente harmônica.
O espraiamento pela área
suburbana, que marcava o início de seu processo de
industrialização se fez acompanhar da penetração
através da abertura de túneis nos grandes maciços
montanhosos, associando-se, desta forma, à ocupação
territorial, a conquista de outros recursos de lazer, com o acesso
às praias da Zona Sul, que originou a grande expansão
imobiliária.
Em decorrência da explosão
demográfica, a cidade passaria a sofrer um grande sacrifício
em seu equilíbrio urbano. Os serviços de
infra-estrutura já não mais atendiam à
demanda de uma população que crescia rapidamente. Os
problemas de nossa cidade estavam a exigir dos responsáveis
pela sua administração, não apenas recursos,
mas também visão e coragem para a retomada de
projetos de execução a médio e longo prazos,
despojados de sentido imediatista e improvisador, com a amplidão
suficiente para permitir que o Rio recuperasse a sua unidade urbanística.
O Rio, mercê das suas
características de capital do país, durante longo
período, e importante centro de atividades econômicas,
financeiras, de interesses sócio-culturais, não pôde
furtar-se à inelutável tendência de
megalopolização, concentrando em área
restrita provida de uma infra-estrutura de serviços públicos
essenciais a uma vida comunitária razoável, uma
esmagadora demanda populacional egressa de centros interioranos do
país que lhe conferiu, em dados do recenseamento de 1970,
uma densidade populacional de 3.631 hab/km2.
Mas o processo não se
confina aos limites físicos e administrativos do Estado. O
Rio é típico exemplo de cidade atingida
profundamente por um fenômeno já rotulado de "conurbação",
exaustivamente estudado pelos urbanistas e sociólogos
modernos, que consiste num verdadeiro conúbio de cidades
que participam de uma mesma comunidade sócio-econômica,
de forma tão marcante que levou um estudioso a declarar que
"não existem mais cidades no mundo", porque, em
todo o globo terrestre, as pessoas ou vivem em áreas
remotas do campo ou, a grande maioria, em sistemas urbanos, sucessão
de cidades que acabam interligadas.
Os limites políticos que
perduram, contrariando a realidade sócio-econômica
imperante, geraram o problema de sobrecarga do sistema de serviços
básicos do Rio (transporte, saneamento, água,
energia elétrica, subsistência, saúde, educação,
recreação, etc.), decorrente da sua utilização
permanente pela maioria da população das chamadas
cidades "dormitórios", que exerce sua atividade
econômica ou busca diversão na Guanabara. A concentração
populacional de migrantes de outras unidades federativas, atraídos
pela perspectiva de melhor oferta de oportunidades ocupacionais, já
não se confina à fixação nos morros ou
alagados do Estado, mas de tal modo irradia-se para as cidades satélites
no Estado do Rio, que os dados do último recenseamento
apontam densidades demográficas de cidades como Nilópolis
e São João de Meriti, duas a duas vezes e meia
maiores que a do Rio de Janeiro, e com taxas de crescimento
populacional mais do dobro e do triplo do incremento registrado na
Guanabara, como é o caso das cidades de Duque de Caxias,
Itaguaí, Paracambi, São Gonçalo, Magé
e Nova Iguaçu.
Defrontados, administradores que
somos, com um quadro em que só em rápidos bosquejos
e com tintas leves tentamos rabiscar, é lícita a
indagação de como enfrentar tal desafio se os meios
falecem na medida em que as dificuldades se multiplicam e se
tornam de complexidade crescente.
Já em novembro de 1972, em
palestra realizada na Sociedade de Engenheiros e Arquitetos do
Estado da Guanabara, tivemos oportunidade de ressaltar a importância
de o sistema legislativo haver fornecido a diretriz que nos
parecia mais consentânea para a tentativa de solução
do problema, ao prever no texto da emenda constitucional n 1/69, a
inclusão do Art. 64 da Carta Magna vigente, do
estabelecimento de "regiões metropolitanas constituídas
por municípios que, independentemente de sua vinculação
administrativa, façam parte da mesma comunidade sócio-econômica".
Ato recente do Governo Federal
estabeleceu a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, tendo
sido criado o Fundo Contábil para o desenvolvimento da
referida Região. Os reflexos dessa medida se farão
sentir na visão e planejamento globais dos serviços
públicos e de infra-estrutura e no escalonamento de
prioridades para o atendimento das necessidades públicas
das regiões metropolitanas, no disciplinamento da alocação
de recursos para a cobertura das obras; na contenção
do desperdício ocasionado pela multiplicidade de recursos e
de esforços para a obtenção de propósitos
comuns; na uniformidade da concepção e do emprego
das técnicas construtivas e na disciplina de aplicação
mais racional dos investimentos da comunidade e dos poderes públicos,
segundo uma filosofia de ação que prime por
proporcionar, prioritariamente, benefícios socialmente mais
amplos e de exigibilidade mais imediata.
Urge, pois, que possam contar os
dirigentes do Estado, em condições de plena utilização,
com instrumentos de ação técnico-econômica,
de forma a colher os frutos de uma ação coordenadora
que produza a compatibilização dos planos de obras
da Região Metropolitana com as iniciativas já em
curso nos seus Estados formadores.
Na realidade, tem-se feito sentir a
carência de estudos de urbanização mais amplos
e intensos da área metropolitana do Grande Rio, com
pesquisas setoriais que permitam a criação de um
modelo do seu desenvolvimento sócio-econômico,
evidentemente sem que se vise à criação de
uma estrutura urbana, simples produto de um exercício teórico
da imaginação, desprovido de conteúdo técnico
em sua elaboração e carente de recursos político-administrativos
para a sua implantação.
Não obstante isso, as
diretrizes gerais que têm resultado dos trabalhos já
realizados, corporificam um núcleo de idéias
assentes e incontroversas sobre o desenvolvimento e o destino da
região do Grande Rio, entre as quais é lícito
enfatizarem-se as seguintes:
- a evolução demográfica
da região se dará a taxas decrescentes, tendência
observada também em outras áreas metropolitanas do
País, conseqüente a uma mudança de orientação
das migrações internas, em decorrência de
maior equilíbrio no crescimento econômico de outras
regiões do Brasil;
- necessidade de maior dirigismo
do poder público na política de ocupação
das áreas, de modo a obter-se aumento das densidades
brutas das áreas urbanizadas, visando à diminuição
de custos de implantação e melhoria de padrão
de serviços de infra-estrutura urbana;
- manutenção, por
longo período, das funções desempenhadas
pelo Centro Principal da Metrópole, mesmo na ocorrência
de transformações radicais internas, com
aprimoramento da infra-estrutura e das edificações,
e abertura de novas vias de escoamento do tráfego;
- marcante influência da
conformação física da área
metropolitana e mesmo forte condicionamento a ela do processo de
sua ocupação urbana, apresentando, na faixa litorânea,
os fatores - clima e paisagem - como geradores de interesse turístico
e recreacional e, na extensa área entre a Serra do Mar e
os maciços do litoral, servindo de suporte à sua
crescente urbanização, a estrutura viária já
existente;
- predominância do eixo Rio
- São Paulo no desenvolvimento urbano daquelas duas metrópoles,
inter-relacionando-as cada vez mais intensificadamente, seja
através do Vale do Paraíba, com características
industriais, seja através da BR 101, de propósitos
acentuadamente turísticos;
- o setor terciário da
economia, nele integradas as atividades do comércio, da
intermediação financeira, de transportes e
comunicações, do governo, de aluguéis e do
turismo, continuamente a desempenhar função
predominante na estrutura econômica do Grande Rio, com
participação da ordem de 70% na renda interna e no
nível de empregos da área.
Assentadas, entre outras, essas
premissas, que resultam de constatações e observações
realizadas por estudiosos do problema, há que formular
planos setoriais de infraestrutura, específicos, de
transporte, de saneamento, de recreação, de localização
de indústrias etc., de tal maneira que sejam levados em
conta todos aqueles pressupostos básicos.
No que respeita ao problema de
transportes da Região, não podemos prescindir da
elaboração de um plano diretor de vias expressas que
se apóiem no atual sistema de vias regionais e que sirvam
de suporte à implantação dos corredores
urbanos mais significativos da região; o de sentido
leste-oeste, de finalidade predominantemente turística e
residencial para as classes média e acima da média;
o intermediário, com funções mistas,
industrial e residencial para as classes média e baixa; e o
interior, do extremo oeste até a margem ocidental da baía
de Guanabara com a mesma destinação do anterior.
Mas, a problemática dos
transportes não se esgota com o traçado de uma malha
viária de penetração. Há ainda que se
conceber e implantar-se um Sistema de Transporte de Massas que
absorva e coordene os grandes fluxos de pessoas na área do
Grande Rio e lhes proporcione condições condignas de
viagem, em tempos razoáveis e a custo tarifário
suportável, mediante a conjugação das várias
modalidades de transporte que desempenham funções
que conduzem a um propósito comum: o de realizar o
deslocamento massivo de pessoas na área. É então,
fundamental que haja integração, ou coordenação
em nível superior ao das respectivas entidades operadoras
dos sistemas, dos futuros serviços do Metropolitano do Rio,
das linhas suburbanas da Central do Brasil, da Leopoldina e da
Companhia de Transportes Coletivos da Guanabara, para obtenção
de economia de escala, unidade de planejamento, e supervisão
dos serviços de transporte de massas.
A abordagem dos problemas de
saneamento da área deverá partir dos resultados de
estudo preliminar sobre a capacidade da Baía de Guanabara
em operar como agente receptor e auto-depurador da poluição
causada pelo lançamento de esgotos.
As próprias características
físicas da Baía favorecem o alto grau de poluição
a que ela poderá atingir se não se fizer a proteção
adequada às suas orlas, com a construção de
um grande sistema interceptor geral, contornando a Baía de
Guanabara, medida de grande e significativo alcance, que têm
a precedê-la a curto prazo e em caráter de
indispensabilidade, as seguintes obras: estações de
tratamento de alta eficiência; interceptor e emissário
submarino de Niterói; sistemas secundários de
esgotos, com lançamento adequado.
O exame das condições
locacionais de indústrias na área revelou a
viabilidade de implantação de grandes complexos
integrados voltados para a Siderurgia, a Construção
Naval e da Petroquímica. Nesse sentido, é imprescindível
a consolidação de distritos industriais em Santa
Cruz e Duque de Caxias, centralizados, respectivamente, nas
atividades da COSIGUA e da REDUC, FABOR e a complementação
das indústrias de construção naval, que já
representam 60% da tonelagem da produção brasileira,
com a implantação de um complexo de indústrias
satélites para a fabricação da enorme gama de
componentes requeridos pelos estaleiros.
Como vêm, por essas ligeiras
referências a alguns dos problemas do Grande Rio, é
complexa a tarefa de equacioná-los e dar-lhes soluções
adequadas.
Todavia, manifestamos nossa
integral confiança nos futuros governantes deste Estado e
desta cidade, confiança no sentido de que saberão
conduzir os destinos da Região Metropolitana do Rio de
Janeiro, transformando-a num grande pólo econômico e
social e em relação ao Rio de Janeiro, tornando-o
uma cidade ainda melhor para se viver.
Palestra realizada na Associação
Comercial do Rio de Janeiro, em 12 de setembro de 1973.
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